Eu diria que os últimos capítulos de Sapiens, de Yuval Noah Harari, são muito Black Mirror. Â E daí você vê que Black Mirror não é tão viagem como parece; pelo menos para uma pequena parte dos sapiens que tem acesso í s mais recentes descobertas científicas relativas í bioengenharia, genética, engenharia cyborg…
〈Música impactante〉:D
Então.. Sapiens é, de fato, bastante surpreendente. O autor, após resumir de maneira espetacular a história humana, salta í filosofia. Existe sentido na vida? Se sim, qual é? O que é a felicidade? Somos mais felizes hoje que nossos ancestrais? Conseguiremos reviver criaturas extintas? Conseguiremos atingir a imortalidade?
Harari consegue fazer com que o leitor vague por um futuro distante nos capítulos finais, um ensaio para o seu outro livro, Homo Deus: Uma Breve História do Amanhã, no qual, de acordo com algumas resenhas que li, projeta com mais afinco cenários futuros da humanidade. Fato que mesmo em Sapiens o escritor já demonstra uma desenvoltura espetacular ao mencionar um possível futuro em que nos tornamos um verdadeiro deus.
Não só os capítulos finais me fascinaram. O livro é dividido em 4 partes: revolução cognitiva, revolução agrícola, a unificação da humanidade e a revolução científica. Cada uma destas 4 partes apresenta capítulos envolventes e o livro só vai ficando mais difícil de largar.
A vida dos caçadores-coletores, a ‘fraude’ da revolução agrícola, as ‘ficções’ que impulsionam a humanidade (dentre elas a religião), as descobertas cientificas, o colapso da família e da comunidade frente ao Estado, a paz obtida pelo poder atômico… assuntos conhecidos, porém sob uma perspectiva diferente – pelo menos em alguns tópicos.
Mesmo tendo adorado o livro, não concordo com 100% dos posicionamentos do autor. Me incomoda a forma pela qual ele trata a fatalidade do imperialismo, como se com ele não pudéssemos nos indignar por sua inevitabilidade e quase necessidade para o andamento do desenvolvimento do ser humano como sociedade e indivíduo. Não que ele não sinta pelas populações dizimadas pelos dominadores – dos astecas aos aborígenes tasmanianos -Â mas me parece que existe uma mensagem de que não há como ser diferente e isto é assim: natural.
Por exemplo: ele cita um estudioso imperialista, William Jones, que chegou í índia em 1783 para servir como juiz na Suprema Corte de Bengala. Jones era um representante do império inglês, mas estudava as culturas, histórias e as sociedades da ísia, em particular da índia. Foi Jones quem apontou similaridades entre o sânscrito, o grego e o latim, bem como similaridades entre todas essas línguas e o gótico, o celta, o persa antigo, o francês e o inglês, identificando, portanto, aquela que veio a ser conhecida como a família de línguas indo-européias.
Este é apenas um exemplo que achei interessante; há vários outros mostrando que os impérios aterrorizavam (ainda o fazem), mas também contribuíam (e contribuem) para o desenvolvimento do conhecimento de toda a humanidade e ainda para apresentar ao povo “conquistado” avanços que estes ainda não teriam alçado, como indivíduos ou coletividade.
Gosto de pensar que podemos ser melhores que isto, principalmente porque em território brasileiro há inúmeras tribos indígenas sem contato com o homem branco. Elas precisam de nossos avanços, leis, costumes, tecnologia? Os caçadores-coletores não eram provavelmente mais felizes? Não demos um tiro no pé ao entrarmos de cabeça na revolução agrícola? São coisas a se pensar.
Indico, enfim, fortemente, a leitura do livro. Tenho certeza que não irá se arrepender. Se tudo der certo acrescentarei em minha lista do ano o Homo Deus, dele também. Certeza de ótima leitura.