“Todos nós saímos de O Capote de Gogol”, disse Dostoiévski e foi justamente por causa desta frase que eu tive interesse em ler este maravilhoso escritor. 🙂
Nikolai Vasilievich Gogol nasceu em 1809, na cidade de Poltava. Sua nacionalidade é motivo de controvérsia, pois sua cidade natal fazia parte do Império Russo na época, mas atualmente pertence í Ucrânia. Como consequência, tanto a Rússia quanto a Ucrânia reivindicam a sua nacionalidade. Muitos de seus trabalhos foram influenciados pela tradição ucraniana, mas Gogol escreveu em russo e sua obra é considerada herança da literatura russa.
Aos 20 anos Gogol conheceu Púchkin (ambos influenciadores de Tolstoi e Dostoiévski), o maior escritor russo de então, e ficaram bem amigos. Gogol não era político – ao contrário de Púchkin -, não tinha um programa de ação contra o regime do Czar. Era um homem de preocupações místicas, religiosas. Tinha, pelo que li, um misticismo até doentio.
Seus livros são bem diferentes dos dos famosos escritores russos, os tradicionalmente conhecidos no ocidente. Ele se funda no realismo, mas com um pé inteiro no que seria chamado posteriormente de surrealismo.
O conto “O Capote” é bem interessante; seu protagonista se tornou o arquétipo do pequeno funcionário público russo. Ou seja, foi o primeiro modelo ou imagem deste tipo de funcionário, que, a meu sentir, representa também outros tipos de funcionários públicos, não só os russos e os daquela época.
Também interessantes desta edição da Editora 34 são os contos “O Nariz”, “Noite de Natal” e “Viy”.
“Diário de um louco” foi o meu preferido (todos da edição da foto): a história narra as aventuras de um funcionário público que nutre uma paixão platônica por Sofia, a filha de seu chefe. Com um humor insuperável, Gogol demonstra que este amor não correspondido (Sofia está noiva de outro) transforma a sanidade do protagonista em loucura. O conto é um diário e à medida que a loucura chega, as datas dos escritos vão ficando desconexas.
Em um belo dia ele “se descobre” rei da Espanha e passa a espalhar a notícia onde quer que vá, iniciando sua derrocada social. Rabugento, reclamão, ele tem grandes idéias, entre elas interceptar a correspondência de dois cachorros: Medji (a cadelinha de Sofia) e sua amiga Fiel. O diálogo das bichinhas é realmente divertido para nós, leitores. Mas não para o protagonista, pois, através dele, ele descobre que sua amada está realmente “enrabichada” (uma das expressões da cadelinha) por seu namorado Tieplov. O apaixonado fica, então, mais perturbado e se diz rei Fernando VIII. Mais loucuras são proferidas e o personagem acaba na cadeia, onde sofre toda sorte de maus tratos que o fazem desejar que o matem de uma vez. O conto é divertido, mas a parte final traz a reflexão sobre a loucura real e suas consequências.
Nikolai Gogol foi o maior escritor russo da primeira metade do século XIX, introdutor do realismo na literatura russa e precursor de todos os grandes escritores russos que se lhe seguiram.
Não há como não repetir: “Todos nós saímos de O Capote de Gógol”.
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